08/12/2009

COPENHAGUE - PERGUNTAS E RESPOSTAS SOBRE COP-15

Quase nada se fala sobre as questões ambientais, em Angola. Enquanto se prepara o encontro de Copenhaga para que os líderes discutam sobre a emissão de gases, a nossa mídia passa à margem. Tomando em conta o interesse da matéria, decidimos transcrever um email recebido de Maurício Tavares, mtavares2004@yahoo.com.br, a 07 de Dezembro de 2009.

S. Paulo, domingo, 06 de dezembro de 2009

COPENHAGUE
Hora da decisão

Para brasileiro, clima não é o maior problema
Pobreza é o que mais preocupa; mesmo ricos desconhecem as causas da mudança climática
RICARDO MIOTO
DA REPORTAGEM LOCAL

O brasileiro não considera o aquecimento global uma prioridade e erra feio ao apontar as suas causas. Mas se diz disposto a pagar para amenizá-lo, mostra pesquisa Datafolha.

O Datafolha ouviu 2.073 pessoas em 124 municípios em todas as regiões do Brasil entre 9 e 11 de setembro. Numa lista de dez grandes problemas mundiais, apenas 5% dos entrevistados mencionaram o aquecimento global como sua maior preocupação. Pobreza, violência e fome aparecem nos primeiros lugares. Em empate técnico (a margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais para mais ou para menos) aparecem mortalidade infantil (6%), falta de acesso à educação (5%) e terrorismo (4%). A biodiversidade aparece como preocupação principal de apenas 1% dos entrevistados.

Podendo escolher mais de uma opção, os entrevistados apontaram a falta de cuidado com o lixo (com 60%) e com a água (45%) como os maiores culpados pela mudança climática. Só depois surgem carros (36%) e desperdício de energia (32%), que estão entre as principais causas do problema.
Ainda assim, as pessoas se dizem dispostas a gastar dinheiro em nome do combate ao aquecimento global, seja em mais impostos, em uma conta de luz mais cara ou no supermercado. A maioria dos entrevistados (58%) diz que pagaria imposto para preservar a Amazônia e reduzir as emissões.

"É a resposta socialmente esperada. Mostra que há receptividade [à questão ambiental]. Mas pergunte quando as pessoas pagaram mais caro para favorecer o ambiente. Provavelmente ninguém saberá dizer", diz Fábio Mariano, especialista em consumo da ESPM.

São Paulo, domingo, 06 de dezembro de 2009

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Copenhague

A capital do impasse
Cúpula do clima começa amanhã com racha entre nações ricas e pobres e propostas insuficientes para conter o aquecimento global

Greenpeace

"Pare a mudança climática aqui", diz bandeira colocada pelo Greenpeace em barco na entrada do porto de Copenhague, na última quinta-feira

CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA

O encontro internacional mais importante do século começa amanhã em torno de uma dúvida fundamental: como chamar sua cidade-sede, a capital da Dinamarca. Alguns apostam que o melhor apelido para Copenhague é "Flopenhague" (de "flop", ou fiasco, em inglês). Outros preferem "Hopenhague" -de "hope", esperança.

O apodo mais adequado dependerá do que fizerem os representantes de 193 governos que se juntam em Copenhague até o próximo dia 18. Eles deverão definir como a humanidade combaterá seu maior desafio coletivo, o aquecimento global.

Os diplomatas e os 95 chefes de Estado que prometeram comparecer à COP-15 (Décima Quinta Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas) precisam fechar um acordo que amplie e prolongue o Protocolo de Kyoto. O tratado, de 1997, estabelece medidas para a redução de emissões dos gases-estufa, em especial o gás carbônico (CO2).

Produzidos pela queima de combustíveis fósseis e pelo desmatamento, esses gases retêm o calor irradiado pela Terra na atmosfera. A previsão do IPCC, o painel do clima da ONU, é que, se nada for feito para contê-los, a temperatura possa crescer em 3C até 2100.

Kyoto tem metas pífias, não prevê reduções para os países emergentes, foi rejeitado pelos EUA e seu primeiro período de reduções vence em 2012.

É consenso na comunidade internacional que é necessário um novo acordo, que opere de 2013 até 2020. A ciência avançou desde Kyoto, e hoje há um número considerado desejável de estabilização de gases-estufa na atmosfera: 450 ppm (partes por milhão) de CO2, para ter uma chance de pelo menos 50% de manter o aquecimento global até 2100 menor que 2C -limite considerado "seguro".

É este o eixo principal do acordo que se negocia em Copenhague: a mitigação. E aqui "Flopenhague" sai na frente de "Hopenhague" : as propostas de corte de carbono para 2020 colocadas na mesa pelos principais países poluidores, somadas, levariam a uma redução de cerca de 15% nas emissões globais em relação a 1990. Para estabilizar o CO2 em 450 ppm, é preciso cortar de 25% a 40%.

O segundo eixo principal do acordo é o financiamento: como os países ricos, principais responsáveis pelo aquecimento atual, ajudarão os países pobres a descarbonizarem sua economia. As cifras necessárias são estimadas em US$ 150 bilhões a US$ 300 bilhões ao ano. Até agora, nenhum país rico disse com quanto desse quinhão pretende contribuir.

Como as metas dos emergentes têm sua execução condicionada ao apoio dos ricos, a negociação não anda.

Para trazer "Flopenhague" ainda mais para perto, existem os EUA. A maior economia do mundo chega a Copenhague impossibilitada de assinar qualquer acordo com valor de lei, já que o presidente Barack Obama depende da aprovação de uma lei de mudanças climáticas no Senado -o que só deve ocorrer em 2010. Sem os EUA, que emitem quase 20% do carbono do mundo, não há acordo.

O resultado mais provável da cúpula, portanto, é um acordo político -que ninguém é obrigado a cumprir. "Não será o acordo dos meus sonhos, nem dos sonhos da Angela Merkel", capitulou na quinta-feira o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado da colega alemã.

É na ação dos chefes de Estado que repousa agora "Hopenhague" . Lula e Merkel, além do francês Nicolas Sarkozy, do britânico Gordon Brown e do próprio Obama (que estará lá, mas em um dia diferente dos outros), já não podem mais criar em Copenhague a solução para a crise climática. Mas ainda podem produzir um acordo político que resolva o impasse e produza uma data para o tratado legal. Melhor que nada.

São Paulo, domingo, 06 de dezembro de 2009

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Um conto de três emissores
Apesar de ter obrigações menores de corte de CO2, o Brasil tem habitantes que emitem muito (a média nacional é alta em função do desmatamento: 11,5 toneladas ao ano). Não se considera a desigualdade interna, porém, nos planos de redução de emissões. Veja três brasileiros diferentes e saiba por que pobres não deveriam ter a mesma meta de corte dos ricos.

EDGAR RODRIGUES:
EMISSÕES QUASE NULAS
Edgar, 41, mora em uma estrada de chão no bairro paulistano de Marsilac, 60 km ao sul do centro. Sua casa é cercada pela mata atlântica. Mas não diga que veio "lá de São Paulo". "Aqui também é São Paulo!"

Só fez até a quinta série e não está muito preocupado com climatologistas. Mas emite menos CO2 do que um nigeriano típico (uma tonelada ao ano).

Para ir trabalhar (há 20 anos presta serviços na Subprefeitura de Parelheiros, bairro ao lado), anda 15 minutos até o asfalto para pegar um ônibus. A esposa Rosa fica cuidando da casa. Criam porcos e galinhas.

Aos poucos, foram comprando os parcos eletrodomésticos que têm e criando os cinco filhos. A gurizada cresceu brincando na terra, acostumada com os bichos que aparecem.

Edgar gosta de mostrar uma foto em que está segurando uma cobra-coral. Questionado sobre sua coragem, se faz de modesto. "É que eu tinha bebido umas pinguinhas, né?" (RM)

HENRIQUE TOMMASINI:
4 TONELADAS DE CO2 AO ANO
Henrique, 25, estudou em escola pública. Seu primeiro emprego foi carregando caixas como repositor em supermercado, mas só por uma semana. "Era horrível, vi que era melhor estudar. Mas se tivesse ficado estaria fortão, não?", brinca.

Hoje, trabalha "preenchendo guias" em uma agência da Caixa no centro. Passou no concurso (nível médio) em 2006 e deu entrada em um carro popular -acha o transporte público cheio demais. Com ele, vieram 72 parcelas de R$ 300.

Mora na Saúde (zona sul). Após anos no cursinho, agora é aluno da USP (no Butantã). Tudo é longe, então dirige cerca de 50 km por dia -abastece o veículo com gasolina várias vezes por mês. É assim que emite mais CO2 -está se aproximando da média de um país desenvolvido como a França (6 toneladas de CO2 por ano).

Mesmo porque já tirou passaporte e fará, em breve, sua primeira viagem internacional -até o Peru, de avião. (RM)

PEDRO:
200 TONELADAS DE CO2 AO ANO
"Sou superfã do Al Gore. Ter visto "A Verdade Inconveniente" foi um marco na minha vida", brinca Pedro (nome fictício), 35, gerente de marketing de uma multinacional.

Ele mora no Rio de Janeiro, mas a mulher e o filho ficam em São Paulo. Os fins-de-semana são dedicados a eles -entre idas e voltas, pelo menos oito voos por mês, portanto.

Mas esse valor pode chegar a 20. Muitas das viagens são para o exterior, até a Europa, onde fica a sede da multinacional.

Aviões emitem muito CO2. Pedro, então, gera grande impacto -seria um enorme emissor mesmo se morasse nos EUA (com emissão per capita de 20 toneladas de CO2 ao ano).

Emite também por causa do calor do Rio, que significa ar condicionado sempre ligado.

"Sempre", no caso, é muito. Salário de executivo é alto, mas ele trabalha mais de 14 horas ao dia. Com o tempo escasso, mora perto do trabalho -não emite muito CO2 dirigindo. (RM)

São Paulo, domingo, 06 de dezembro de 2009

PERGUNTAS E RESPOSTAS
1 - O QUE É COP-15?
A 15ª Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas, que vai de amanhã ao dia 18 em Copenhague, Dinamarca, é o encontro internacional que visa avançar na produção de um novo acordo de proteção ao clima global, que leve a humanidade a reduzir as emissões de gases de efeito estufa, em especial o gás carbônico (CO2). Um acordo internacional de 2007, o Plano de Ação de Bali, determinou que o novo tratado fosse concluído em dezembro de 2009.

2 - O QUE HÁ DE ERRADO COM O ACORDO ATUAL?
O Protocolo de Kyoto, assinado em 1997, tem metas muito modestas. Por ele, um grupo de 36 países industrializados precisa reduzir suas emissões em 5,2% em relação aos níveis de 1990 até 2012. Os EUA, o principal poluidor do planeta, rejeitaram Kyoto, e as economias emergentes (Brasil, Índia e China) são desobrigadas de metas. Além disso, o primeiro período de Kyoto expira em 2012 e não há nada para pôr no lugar dele ainda.

3 - MAS PRECISAMOS MESMO DE UM ACORDO? O AQUECIMENTO GLOBAL NÃO PAROU EM 1998?
Não. O que aconteceu foi que 1998 foi o ano mais quente registrado desde o início das medições com termômetros, e os anos seguintes foram mais frios que ele. Apesar de o clima ser extremamente variável, todas as séries históricas de dados dos anos 1990 para cá indicam um aquecimento de 0,2ºC por década. E todos os anos do século 21 estão entre os dez mais quentes desde que as medições começaram, como mostra o gráfico abaixo.

4 - MESMO ASSIM, AS INCERTEZAS CIENTÍFICAS SÃO GRANDES E OS CUSTOS SÃO ALTOS. NÃO É MELHOR ESPERAR?
Sim, há incertezas. E os custos não são desprezíveis: só no setor de energia, até 2030, será preciso gastar mais US$ 10,8 trilhões de dólares para cortar emissões de carbono, segundo a Agência Internacional de Energia. O problema é que a incerteza corta dos dois lados, e o custo de um aquecimento global descontrolado (tempestades, secas, inundações, fome) pode chegar a 20% do PIB mundial até o fim deste século. No Brasil, até 2030, esse custo pode ser de até R$ 3,6 trilhões.

5 - EM QUANTO É PRECISO, ENTÃO, REDUZIR AS EMISSÕES?
O IPCC, o painel do clima da ONU, tem sugerido que as concentrações de gás carbônico na atmosfera precisam ser estabilizadas em 450 ppm (partes por milhão) se quisermos ter uma chance de evitar um aquecimento de mais de 2ºC até o fim deste século. (Hoje, estamos em 385 partes por milhão.) Este é o limite considerado "seguro", além do qual a humanidade e os ecossistemas teriam muita dificuldade em se adaptar às mudanças climáticas. Para isso, as emissões dos países desenvolvidos precisam cair entre 20% e 45% em relação a 1990 até 2020.

6 - E SE NÃO REDUZIRMOS ATÉ 2020?
Não existe uma data "mágica". O problema é que, quanto mais o tempo passa, mais caro fica reduzir as emissões. Hoje a humanidade joga ao ano na atmosfera quase 29 bilhões de toneladas de gás carbônico, contra 21 bilhões em 1990, o que ultrapassa as previsões mais pessimistas de emissão do IPCC. Caso as emissões não cheguem ao pico em 2020 e comecem a cair em seguida, o custo de redução ficará proibitivo. Ainda segundo a Agência Internacional de Energia, cada ano de atraso aumenta a conta da estabilização em US$ 500 bilhões.

7 - QUAIS SÃO OS ELEMENTOS DO NOVO ACORDO DO CLIMA?
O tratado que está sendo negociado prevê dois grandes eixos, ou trilhos: o primeiro é o do Protocolo de Kyoto, que ganharia um segundo período de compromisso, com metas mais amplas dos 36 países signatários. O segundo é o do chamado LCA, que prevê compromissos voluntários (mas que podem ser cobrados pela comunidade internacional) dos países emergentes e dos EUA. Além disso, é preciso estabelecer como financiar o combate ao efeito estufa nos países pobres, como será a adaptação destes e a transferência de tecnologias de energia limpa, que ajudem o mundo a migrar para uma economia de baixo carbono.

8 - E QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS ENTRAVES A UM ACORDO EM COPENHAGUE?
São dois: mitigação (redução de emissões) e financiamento. Os países ricos relutam em se comprometer com metas ambiciosas de corte de emissão, pois enxergam nelas prejuízos econômicos. Somadas, até agora, as propostas colocadas na mesa pelos países ricos variam entre 16% e 23% de redução em relação a 1990, muito menos do que o problema exige. A outra questão é que nenhum país rico disse quanto dinheiro dará para financiar os países pobres.

9 - OS EUA REJEITARAM KYOTO. ELES VÃO PARTICIPAR AGORA?
O presidente Barack Obama assumiu o governo disposto a combater a mudança climática e a livrar os EUA de sua dependência em petróleo. Portanto, está disposto a um acordo. Mas, para agir em Copenhague, ele depende da aprovação, pelo Senado, da chamada lei Waxman-Markey, que estabelece a meta americana de redução de emissões. Como a lei não será aprovada neste ano, Obama não pode assinar nenhum acordo em "legalmente vinculante", quer dizer, que tenha valor de lei.

10 - ENTÃO NÃO HAVERÁ UM TRATADO LEGAL EM COPENHAGUE COMO HOUVE EM KYOTO?
Dificilmente. O resultado mais provável será o que os diplomatas chamam de "decisão da COP", ou seja, um documento político que estabeleça linhas gerais de ação e dê um prazo para a assinatura de um tratado legal. Espera-se que esse acordo político, porém, contenha metas de redução de emissões para os países ricos e emergentes, um valor para financiamento e ações em adaptação e transferência de tecnologia.

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