28/05/2010

CARTA ABERTA A MAWETTE JOÃO BAPTISTA, GOVERNADOR DE CABINDA

A 22 de Maio de 2010, o Governo da província de Cabinda impediu a realização de uma marcha organizada para a capital daquela província com o propósito de exigir a libertação imediata dos defensores de direitos humanos detidos em consequência do ataque contra o autocarro que transportava a selecção de futebol do Togo, durante o CAN 2010.

Recebemos dos organizadores a presente carta aberta que decidimos transcrever na íntegra:
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CARTA ABERTA
A MAWETE JOÃO BAPTISTA
GOVERNADOR DE C ABINDA
Vinte e dois de Maio, limiar do Dia-da-África, revelou a pobreza da política e a política pobre. Alessandro Manzoni declarava: A quem não se deu coragem, não pode tê-la. Nós, contudo, não precisamos de coragem por não termos de encher a alma para enfrentar uma legião de combatentes. Apenas homens de ideias, de convicções e, sem vergonha, cabindas.
Senhor Governador, devíamos ter algo que nos unisse: o pertencermos a uma sociedade, talvez, a mesma. Isto implicaria mesmos direitos e deveres, maugrado funções diferentes. Esta condição, base do nosso operar, far-nos-ia seres da política e, mutatis mutandi, animadores conscientes da mesma.
Vimos, no entanto, o que nos diferencia: enquanto o senhor é instrumento de uma política, nós somos frutos da consciência do ser-político. Daí V. Excia não precisar da criatividade que a política exige, porque, ao matar a política na sua essência sine qua non participativa, tornou-se um anti-politica. Isto faz de V. Excia um anti-cultura, um alérgico à história, um cego à evolução do mundo, um impenetrável ao diálogo, um incapaz de ler a história e, finalmente, um anti-cabinda primário.
A criatividade da política engendra ideias. Estas abrem espaço ao intercâmbio, à evolução e à descoberta do OUTRO. Este não é um Objecto, mas Sujeito (Gabriel Marcel).
V. Excia, no dia 22 de Maio, Sábado, ao colocar por toda a dimensão do território de Cabinda um dispositivo tão ingente quão ridículo (carros armados, helicópteros, polícias, militares, uma legião de Sinfos, detenções e uma rádio espalhando disparates), demonstrou, claramente, ser simplesmente um buldozer de uma não-política; inconsciente do cargo que ocupa.
O seu curriculum descreve um homem de infindas missões diplomáticas. Deveria, em consequência, corresponder a alguém aberto ao mundo e às suas constantes e imprevisíveis mutações, mas revela, todavia, um incorrigível trungungúfilo. Isto fez com que muitos de nós, mesmo no seio do seu partido, e por que não de todo o povo, vissem no seu populismo apenas captatio benevolentiae; um demagogo desajeitado. Toda e qualquer medida, por mais moralizadora que for, se não respeitar o Homem, pelo contrário, o maltrata, expondo-o à irrisão de multidões, não colhe. Não nos enganámos. Aí está o seu ADN: reprimir, tendo V. Excia tudo à disposição: o mundo forense e castrense e uma leitura enviesada da Constituição. Em suma, todas as instituições do estado angolano.
Quem o indigitou não teve em conta as capacidades governativas até agora não demonstradas mas, sim, o seu jeitinho mórbido em gerar mártires.
Trazemos-lhe, no entanto, a recordação que não é o mesmo arrancar viaturas em posse dos seus correligionários e açaimar liberdades. Estamos, aqui, para ver se o seu consulado, à imagem dos maiores ditadores da história, vai extirpar sentimentos seculares de auto-afirmação deste Povo, porque, até agora, a cooptação, o incrementar dos vira-casaca, o yabimanientar, a integraciofobia com cargos administrativos, mordomias, benesses e lavagem de cérebros não o lograram.
Cabinda, 23 de Maio de 10
Pela Sociedade Civil de Cabinda
José Marcos Mavungo

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