04/09/2013

VIOLÊNCIA NAS RUAS E A PROTECÇÃO JUDICIAL



 (foto de Jesse Lufendo obtida das redes sociais)

Decorreu ontem, 3 de Setembro, uma conferência de imprensa organizada pelo GTMDH, num dos hotéis da capital, sob o lema "Avaliação Sobre Segurança Pública e Direitos Humanos em Angola". Na mesma, a OMUNGA apresentou uma tipificação da violência policial contra o cidadão, apresentado casos concretos para a referida demonstração.

A OMUNGA considera que a violência policial está estreitamente ligada com a manipulação deste instrumento de segurança pelo sistema que detém o poder e pelo uso do sistema judiciário que formaliza e legitima tal violência.

Acompanhem o resumo da apresentação que foi feita por Joao Malavindele Manuel.

VIOLÊNCIA POLICIAL NAS RUAS E A PROTECÇÃO JUDICIAL

A OMUNGA é uma associação com sede no Lobito que trabalha na promoção e protecção dos Direitos Humanos. Como é sabido, tem também o Estatuto de Observador da Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos.

Neste momento, vamos apenas apresentar factos que nos levam a considerar de extrema preocupação, em relação ao comportamento violento por parte da polícia nacional, em relação ao cidadão. Por outro lado analisar como este mesmo comportamento é promovido pelas instâncias políticas e por outro lado, protegido pelo judiciário.

Os factos que aqui apresentamos, referem-se a registos feitos durante este ano e a nível da província de Benguela. Não significam terem sido os únicos, mas tão-somente representam casos acompanhados pela OMUNGA e de representatividade:

1 – VIOLÊNCIA POLICIAL BASEADA NA DISCRIMINAÇÃO

A 30 de Março, de madrugada, dezenas de agentes da Polícia Intervenção Rápida (PIR) vindos de Benguela, da Investigação Criminal e da Unidade Canina, invadiram a comunidade do ex. Centro 16 de Junho, por detrás do Instituto Politécnico, B.º da Lixeira no Lobito.

Sem mandato, nem legitimidade, por volta das 3 horas, iniciaram a arrombar as portas, encontrando os ocupantes das residências, sem roupas, de acordo às denúncias. As vítimas declararam ainda que foram agredidas, incluindo crianças, foram vítimas de furtos, incluindo mulheres grávidas.

Cinco moradores foram detidos sob alegação de ter sido encontrada droga nas suas residências.
Perante este cenário, alguns moradores reagiram apedrejando os policiais.

Como resposta, os agentes regressaram à comunidade, fazendo inclusivamente disparos e prendendo todos os cidadãos que foram encontrando.

10 jovens foram detidos e foram alvo de julgamento sumário e condenados a 9 de Abril pelo Tribunal Provincial do Lobito, sob a acusação de agressão contra a polícia, cumprindo 45 dias de prisão e o pagamento de 45 mil Kwanzas.

Entretanto, os primeiros 5 detidos, foram soltos após o pagamento de cauções duvidosas de valores que variaram entre os 15750,00Kz e os 52500,00Kz. Outros valores foram ainda pagos pelas esposas para que houvesse a garantia dos mesmos.

A 12 de Abril a OMUNGA endereçou uma carta à Procuradoria-geral da República, junto do Tribunal Provincial do Lobito) a solicitar a abertura de um processo de investigação sem qualquer resposta até ao presente momento.

A forma de intervenção policial liga-se ao preconceito relacionado com o facto de que esta comunidade é constituída por ex moradores de rua.

Para além da violência policial verifica-se o envolvimento da procuradoria, acusando injustamente e também encobrindo a ilegalidade de todo o processo e a possibilidade de estar envolvida em extorquir dinheiros e por outro lado, o envolvimento do Tribunal condenando injustamente. 


2 – VIOLÊNCIA POLICIAL PARA DEFENDER INTERESSES PARTICULARES

Há cerca de 8 meses que mais de 100 trabalhadores do Shoprite iniciaram uma greve. A entidade patronal nunca mostrou boa fé em querer negociar. Os trabalhadores reclamam por melhores salários, subsídios de férias, horas extras, transporte e saúde, respeito pela maternidade e dignidade,

A greve é apoiada pelo sindicato ligado à UNTA.

Representantes da entidade patronal, para além de terem utilizado insultos rácicos, impedindo os trabalhadores em greve ao acesso a pontos chaves para visibilizar a greve, retirando os cartazes, impedindo o acesso à água e aos quartos de banho, utilizou a polícia para reprimir os trabalhadores. A mesma entidade patronal, decidiu considerar os trabalhadores em greve como despedidos e assim, contrariando a lei, recrutou novos trabalhadores. O processo continua em tribunal.

Para além do silêncio conivente das entidades públicas, da lentidão do tribunal, a polícia por várias vezes reprimiu violentamente tendo provocado ferimentos em trabalhadores.

A OMUNGA endereçou cartas mas não há qualquer solução.

Para além da violência policial, grave, vê-se que esta foi utilizada em defesa de uma entidade patronal, onde o sistema político se cala, e onde o judiciário de forma cúmplice protege.


3 – VIOLÊNCIA POLICIAL CONTRA EX MILITARES

1137 famílias de ex militares, junto a outros populares, lutam pelo direito à terra para a construção da sua casa, conforme as promessas dos acordos de paz.

Para além do desrespeito por parte da Administração municipal do Lobito, a polícia interveio detendo 6 dos membros da Comissão que lidera o processo por parte dos ex militares, na 1.ª e 2.ª esquadra.

Já a 21 de Agosto, agentes da polícia agrediram os ex militares, incluindo o colaborador da OMUNGA.

A OMUNGA já endereçou cartas a solicitar esclarecimentos sem qualquer resposta até ao presente momento.
A violência policial é acompanhada pela promoção por parte da Administração municipal.


4 – VIOLÊNCIA POLICIAL POR PRAZER

A 21 de Agosto de 2013, a partir das 15 horas, agentes da PIR e de agentes da esquadra da Catumbela, na perseguição de vendedores ambulantes, invadiram o B.º do Caputo, Catumbela.

Lembramos que a antiga praça da Catumbela foi demolida em tempos passados. Em contrapartida, a administração municipal da Catumbela arranjou outro terreno. De acordo aos vendedores e também consumidores, a localização desse terreno não oferece quaisquer condições já que se encontra muito distante.

Como resultado, os vendedores expulsos da antiga praça, continuam a vender ao redor da mesma. 

Foi nesta acção, de perseguição, que o jovem de 21 anos de idade, Aurélio Ndumbo foi interceptado enquanto, de regresso da escola, se encontrava a conversar com uma amiga frente à sua residência.

De acordo às testemunhas, o jovem foi imediatamente agredido tendo feito resistência. Os populares disseram ainda que para além da agressão de que o jovem foi alvo, outros populares, incluindo a sua avó, foram alvo também de agressão quando tentavam interferir em favor do jovem. 

Os populares declaram ainda que foram usados pelos agentes da polícia produtos tóxicos. Declaram também que havia policiais embriagados.

O jovem foi posteriormente algemado e levado numa viatura. De acordo às informações, o jovem foi alvo de julgamento sumário numa sessão que teve lugar no período da tarde de 29 de Agosto, no Tribunal Provincial do Lobito e sentenciado a 30 de Agosto. Foi condenado, tendo pago para cumprir a pena suspensa.

Os familiares não possuem recursos que lhes permitam constituir advogado.

A OMUNGA já endereçou cartas a diferentes entidades locais a solicitar esclarecimentos e a exigir a soltura imediata de Aurélio Ndumbo, considerando este acto vergonhoso e verdadeiro atentado aos Direitos Humanos.
A violência policial mais uma vez foi protegida pela procuradoria-geral da República e pelo tribunal.


Ao apresentarmos estes casos, queremos simplesmente demonstrar que a violência policial está relacionada com a manutenção de um sistema judiciário cúmplice e arrogante.

(vídeo publicado por Central Angola no youtube)


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